quinta-feira, 24 de maio de 2012

Para inicio de conversa

Assim, um ato de fala é um ato carregado de intencionalidade, no qual o falante expressa certo conteúdo proposicional com certa força ilocucionária. Durante o ato de leitura realizado pela professora, de uma receita culinária, por se tratar de um contexto que se insere no cotidiano das crianças, o texto escrito e texto oral são apresentados numa mesma ação contínua, dentro de um mesmo contexto de interação.
Pensar na linguagem da culinária é trazer à discussão um leque de formulações que transcendem o enunciado informático de fazer comida. O texto culinário representa identidades, posições sociais, discussões de gêneros, e gênero textual, símbolos religiosos, performance e cenografia, como lembra Montanari (2008, p.12), O homem desenvolveu-se, também, através da fala, porque as impressões e as ações, míticas ou não, heróicas ou fantásticas, eram transmitidas oralmente de geração em geração numa evolução natural do ser humano, consubstanciando, assim, seu senso de busca de comunicação e interação. O ato de comunicar cresce em suas relações e hábitos e torna a vivacidade de imaginação importante da linguagem humana em todos os seus sentidos, visto que a fala é mais espontânea e acompanha o homem e suas aventuras desde as mais remotas épocas. A esse respeito trata o estudioso Bakhtin que o homem se faz na linguagem e pela linguagem. Dessa forma, a libras, não se configura apenas uma linguagem, uma vez que prestam as mesmas funções das línguas orais, pois ela possui todos os níveis linguísticos e como toda língua de sinais, a LIBRAS é uma língua de modalidade visual-gestual, não estabelecida através do canal oral, mas através da visão e da utilização do espaço. Como a língua de sinais se desenvolve de forma, é lógico e aceitável que os surdos se comuniquem naturalmente utilizando as mãos, cabeça e outras partes do corpo, por estarem privados da audição.
A fala, como um ato linguístico livre e inerente ao homem, se refaz recorrente nas ações e reações da raça humana.  Os hábitos e costumes podem e devem ser explorados e valorizados divido a diversidade desse campo cultural e ser expresso pela oralidade e leitura. Uma criança, por exemplo, desenvolve o ato comunicativo apenas vendo e convivendo com adultos, isto é, ela, mesmo não fazendo uma leitura de livros ou outra informação, comunica-se por situações “sócio interativas” na visão de Vigotsky. Ela traz consigo uma experiência de vida, uma pré-disposição, ou melhor, uma gênese psicológica que a leva a desenvolver suas habilidades, à medida que se mostram para ela situações e desafios para aprendizagens.
A oralidade se torna um dos aspectos da cultura de um povo. É, sem hesitação, no educando, um dos fatores essenciais para que um professor possa referendar o processo ensino-aprendizagem, através de suas múltiplas falas. Os textos culinários configuram-se como textos escritos, registro de uma cozinha burguês e são fontes para a história, para a sociologia, para a lingüística discursiva e para os estudos de uma lingüística pragmática. Dos textos orais, ligados principalmente à população que guarda a memória dos fazeres pela circulação da voz. Se no passado houve dificuldade do seu arquivo, na contemporaneidade a tecnologia encarrega-se de arquivar essas vozes.
Esse quadro é o limiar para se pensar no aspecto decisivo do texto culinário como fundamento de uma pragmática da escola, que desde Paulo Freire houve “uma revolução dos paradigmas científicos educacionais”. Aprende-se mais quando a cultura é o grande suporte. O aprendizado é dinâmico: precisa dos saberes metalinguísticos e não de um texto engessado importado de experiências estranhas. Ou seja, desloca-se a questão do aprendizado à experiência do cotidiano.
Dessa forma insere-se as receitas como um jogo lúdico para o aprendizado de Libras, já que esta se dá a partir da linguagem cênica e da vivência de símbolos e sinais representativos para cada falante, pois o receituário oral tem uma dimensão polifônica, é múltiplo e plural e nele circulam a cultura letrada, pela memória, e a cultura oral, pela pragmática juntamente com a Libras.
Dessa forma, ao inserir as receitas culinárias como fonte de ensino/aprendizagem aos surdos de forma pragmática, a comida, os ingredientes e os utensílios são metáforas linguísticas para esse aprendizado. Deve-se pensar a introdução de receitas como fonte e elo para o ensino de Libras como uma ancoragem fundamental e determinante no estabelecimento de uma cultura letrada desejável, aceitável e verdadeira, para que a escola possa se valer de uma base forte, e assim, como tão enfaticamente se discursa, formar cidadãos críticos visando uma sociedade cada vez mais desenvolvida, justa e que valorizem com isso suas questões culturais.

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